A revolta, a desesperança, o desespero, o rancor, a tristeza são sentimentos estampados nas caras das pessoas com quem me cruzo nos transportes, no supermercado, na rua e até em concertos de rock. Os olhares são de ódio, de inveja, de insegurança, de infelicidade. Mas maioritariamente de desilusão. Oiço menos risos e gargalhadas, menos espontaneidade, menos descontração; até sinto falta de ouvir grupos a planear jantares, festas ou viagens; a planear simplesmente. Tornamo- nos numa sociedade de “nãos”. Não a planos, não a risos, não a festa, não a viagens, não a filhos. Não a tudo que possa ter uma componente finaceira. Passa a ser tudo decidido pelo seu valor quantitativo. O qualitativo fica para depois, para depois da austeridade. Até o humor negro parece estar de greve.
As imagens que no dia de ontem de alguma forma todos tivemos acesso acentuou ainda mais todos estes sentimentos.
Estudos sociológicos falam-nos dos comportamentos de grupo e da violência que pode despertar de forma imprevisível. Certo. Fala-nos também que violência gera mais violência. Certo. Em todo o mundo observamos episódios como os que assistimos ontem. Ataques mútuos e inconscientes em direcções erradas e sem qualquer impacto ou intenção positivos. Ataques que trazem mais desordem, mais tristeza, mais desespero.
É devastante que nesta altura do campeonato em que as manifestações assumem um caracter decisivo na união e força de uma sociedade, haja espaço para comportamentos disruptivos com objectivo nenhum para além da desordem e da violência. Uma violência directa, assumida. É devastante que a resposta a essa violência seja uma violência também indiferenciada.
Andamos todos em luta contra as forças erradas. Há uma enorme falta de respeito pelo trabalho das forças policiais e pelos manifestantes. Vergonha! Vergonha é o que sinto! E revolta-me discursos apoiantes de qualquer um dos lados! Revolta-me discursos de que as forças policiais apenas violentaram manifestantes. Não viram as centenas de pedras na escadaria da Assembleia da República? Por quanto tempo as forças policiais foram provocadas e agredidas sem puderem virar costas à situação? Quanto tempo foram agredidos verbalmente? Insultados? Rebaixados? Serão pessoas que estão por trás dos capacetes e bastões? Terão sentimentos, será que sentem dor? E eles? Como podem "entrar a abrir e varrer manifestantes" de forma indiferente? Contra pessoas que estão paradas e sem atitude agressiva? Contra idosos? E agridem uma vez, e outra, e outra…? Não é deles a função de manter a paz social? Que pessoas são essas? Será essa a única forma de acabar aquele cenário? Terá sido uma resposta dada na mesma moeda?
Uma verdade é certa: estamos todos em luta. Somos todos responsáveis; irracionais quando temos de ser, sentimentais quando nos magoam, violentos quando nos atingem.
Que ninguém se esqueça da verdadeira luta. Uma luta que não é das forças policiais contra os manifestantes nem dos manifestantes contra as forças policiais.
Para quando uma manifestação de todos?
Aeroportos mais movimentados
Há 1 dia